25º

PERDOA-NOS 

Mateus 6

 

Itamar de Paula Marques

 

EXEGESE

12 - E perdoa-nos as nossas dívidas como também nós perdoamos aos nossos devedores.

E - Grego: afíêmeu, palavra comum no NT, que com frequência significa deixar, Mateus 4:11 ou despedir, Marcos 4:36, mas que também se traduz corretamente com a ideia de remeter, João 20:23, ou perdoar, Lucas 5:21 e 23. Quando se emprega a palavra com este segundo sentido, faz-se ressaltar a ideia de que o perdão deixa sem culpa ao pecador[1]

NOSSAS DÍVIDAS - Grego: oféilêma, palavra comumente empregada para referir-se às dívidas legais. Romanos 4:4, mas usada aqui no sentido de dívidas morais e espirituais. Aqui representa o pecado como dívida e o pecador como devedor. A passagem paralela de Lucas diz pecados Lucas 11:4[2]

COMO TAMBÉM PERDOAMOS - Como já perdoamos. No grego uns poucos manuscritos usam o presente, mas a evidência textual estabelece o uso do aoristo pretérito indefinido. Não devemos nos atrever pedir perdão se não perdoamos já o nosso próximo[3]

A NOSSOS DEVEDORES - As pessoas que nos fizeram mal, ou nos prejudicaram.

 

Comentários de Mateus 18:23 a 35.

Parábola do Devedor Implacável

 

         23 - Eis porque o Reino dos Céus é semelhante a um rei que resolveu ajustar contas com os seus servos.

         EIS QUE - Os dois devedores, Mateus 18:23 a 35. No capítulo 18 há uma parábola que ilustra o verdadeiro espírito do perdão. 

         UM REI - Já que esta parábola representa o trato do Senhor para conosco e a forma como deveríamos tratar a nossos próximos, o rei representa Cristo[4]

         FAZER CONTAS - Ajustar contas[5]

         SERVOS - Os servos eram, em realidade, servidores públicos do reino[6].

    

         24 - Ao começar o acerto, trouxeram um que devia dez mil talentos.

         TROUXERAM UM - Só um servidor público de elevada hierarquia poderia estar endividado como o estava este servo. 

         DEZ MIL TALENTOS - Quase cento setenta quatro toneladas de ouro; quantias exorbitantes, escolhidas intencionalmente[7]

         Esta soma equivaleria a uns 340.000 kg de prata, o que teria permitido empregar a 10.000 jornaleiros durante uns 20 anos[8]

 

         25 - Não tendo este como pagar, o senhor ordenou que o vendessem, juntamente com a mulher e com os filhos e todos os seus bens para pagamento da dívida.

         NÃO TENDO ESTE COMO PAGAR - Na Antiguidade, e até em tempos relativamente recentes, ainda nos países ocidentais, podia enviar-se ao cárcere aos devedores. No Oriente Próximo o devedor podia ser vendido por seu credor como escravo junto com sua família. 

         O senhor ordenou que fosse vendido com sua família e todas suas posses. Segundo as disposições da lei mosaica, um hebreu podia vender-se a si mesmo ou ser vendido por um credor, mas era vendido só por um tempo limitado. Quando comprares um servo hebreu, seis anos ele servirá; mas no sétimo sairá livre, sem pagar nada. Êxodo 21:2.

SERVO HEBREU - Não devia ter uma coisa tal como uma servidão permanente e involuntária de um escravo hebreu submetido a um amo hebreu. Levítico 25:25 a 55. No entanto, devido a que a escravatura era uma instituição estabelecida e geral, Deus permitiu sua prática. Contudo, ao mesmo tempo procurou mitigar os males que a acompanhavam. Nos países pagãos os escravos eram comumente considerados mais como animais que como homens. Isto era tanto mais repreensível já que a escravatura não implicava necessariamente nenhuma deficiência mental ou moral no escravo. Os escravos, com frequência eram mais inteligentes e capazes do que seus amos. A grande maioria dos submetidos a uma escravatura involuntária nasceu nela ou foram submetidos pelos azares da guerra. De maneira que a escravatura não era pelo geral um castigo merecido, senão com mais frequência, uma desgraça imerecida. Esses desafortunados não tinham direitos políticos e somente uns poucos privilégios sociais. Não obstante, quase sempre estavam submetidos a um amo que em todo sentido era inferior a eles. Suas famílias podiam ser desfeitas em qualquer momento e divididas entre outros proprietários. Estavam submetidos a cruéis tratos sem nenhuma compensação, exceto nos casos de lesão grave. Podiam-se exigir os trabalhos mais duros, em locais pouco melhores que prisões, em minas insalubres, ou amarrados aos remos das galeras para uma tarefa agonizante durante anos intermináveis. 

         Por contraste, o Senhor protegeu cuidadosamente os direitos dos escravos hebreus, e mesmo fez que a sorte dos escravos estrangeiros fosse muito mais agradável do que em qualquer outra nação. O trato duro estava expressamente proibido. Levítico 25:43. Para o amo, todavia o escravo era seu irmão. Deuteronômio 15:12; Filemom 16. Ao pagar o preço do resgate de um escravo, devia ser computado o tempo que tinha servido a seu amo valorizando seus dias de trabalho como os de um jornaleiro. Levítico 25:50. O cálculo do preço do resgate incluía o tempo que faltava até o ano do jubileu. Levítico 25:48 a 52. O espírito destas leis acerca dos escravos é o mesmo que expressa Paulo em Colossenses 4:1 e o que enunciou ao enviar ao escravo cristão Onésimo de volta a seu amo cristão em Filemom 8 a 16. Em espírito, a lei de Moisés se opõe à escravatura. Sua ênfase na dignidade do homem como feito à imagem de Deus, seu reconhecimento de que toda a humanidade se originou num casal, continha em princípio à afirmação de todo direito humano. Levítico 25:39 a 42; 26:11 a 13. Geralmente os israelitas chegavam a ser escravos dos de sua própria raça devido à pobreza. Levítico 25:35 39 e às vezes por um crime. Êxodo 22:3. Os filhos às vezes eram vendidos para cancelar uma dívida. 2 Reis 4:1 a 7. Em épocas posteriores, devido aos azares da guerra, foram levados como escravos a países estrangeiros. II Reis 5:2 e 3

         AO SÉTIMO - Isto não se refere ao ano sabático. Êxodo 23:11; Levítico 25:4, senão ao começo do sétimo ano após que o homem se convertia em escravo. Deuteronômio 15:12. Quando chegava o ano do jubileu, o escravo hebreu devia ser liberado, sem tomar em conta quantos anos tinha servido. Levítico 25:40. Caso contrário, sua servidão terminava à finalização do sexto ano. Não só seu amo devia conceder-lhe a liberdade senão que estava obrigado a proporcionar-lhe provisões oriundas do gado, da era e do lagar. Deuteronômio 15:12 a 15 a fim de que pudesse começar de novo sua vida. Desta maneira, na primeira das leis civis encontramos benévolas disposições cujo espírito humanitário caracteriza toda a legislação mosaica. Nenhuma outra nação da Antiguidade tratou a seus escravos nesta forma bondosa[9].

Segundo o número dos anos decorridos depois do jubileu, comprarás de teu compatriota e segundo o número de anos das colheitas ele te estabelecerá o preço de venda. Levítico 25:15;

Comentário:

         NÚMERO DOS ANOS - Ninguém podia vender a terra perpetuamente, senão só até o ano do jubileu. Nesse ano, todas as terras voltavam a seus donos originais. Isto não causava problemas para o que tinha comprado a propriedade e agora devia devolvê-la, já que o que tinha comprado sabendo claramente que devia devolvê-la no ano do jubileu. De tal maneira se um homem vendia sua propriedade cinco anos antes do ano do jubileu, não recebia muito dinheiro por ela; pois só ficavam poucas colheitas antes desse ano[10]

         Quando um dos teus irmãos, hebreu ou hebreia, for vendido a ti ele te servirá por seis anos. No sétimo ano tu o deixarás ir em liberdade. Deuteronômio 15:12.

Comentário:

SE VENDER - Êxodo 21:2 a 6; Jeremias 34:9 a 14. Um homem podia vender-se como escravo, ou ser vendido por ordem judicial. Em todos os casos os escravos israelitas deviam ser bem tratados por seus irmãos e, quando não eram isentados antes, eram postos em liberdade no ano sétimo. Êxodo 21:20, 26, 27; Levítico 25:39, onde se detalham as obrigações do amo e respeito à forma de tratar aos escravos.

AO SÉTIMO - O ano sabático afetava todos os aspectos da vida. Levítico 25:2. Mas não deve confundir-se o sétimo ano, ano da libertação do escravo, com o ano de descanso sabático. O ano da libertação do escravo seguia a seis anos de servidão. Podia coincidir com o ano sabático, ainda que não necessariamente. A escravatura era uma instituição social aceita nesses tempos, mas Deus ordenou leis para proteger aos escravos como filhos de Deus, como irmãos numa comunidade religiosa, e como cidadãos de um sistema social que tinha por meta a liberdade dos homens[11]

         As disposições legais protegiam essa pessoa do trato duro que costumava dar-se a um escravo. Levítico 25:39; Deuteronômio 15:15. Deveria recordar-se que a parábola tem por meta ensinar uma verdade central, e que muitos de seus detalhes são de pouca importância e se adicionam só a fim de arredondar a história. À parte da parábola que fala de que o servo tinha de ser vendido como escravo não deve interpretar-se no sentido de que Deus vende a alguém como escravo[12]

 

         26 - O servo, porém, caiu a seus pés e, prostrado, suplicava-lhe: Dá-me um prazo e eu te pagarei tudo.

         PROSTRADO – Uma maneira comum usual no Oriente de expressar máximo respeito e reverência aos homens, aos ídolos e a Deus. Ester 8:3; Isaías 46:6; Daniel 3:7[13]

 

         27 - Diante disso, o senhor, compadecendo-se do servo, soltou-o e perdoou-lhe a dívida.

         PERDOOU-LHE A DÍVIDA - Em forma figurada, a dívida representa o registro de pecados computados contra nós. Bem como o devedor da parábola somos completamente incapazes de cancelar essa dívida. Mas quando nos arrependemos para valer, Deus nos livra da dívida[14]

 

         28 - Mas, quando sai dali, esse servo encontrou um dos seus companheiros de servidão, que lhe devia cem denários e, agarrando-o pelo pescoço, pôs a se a sufocá-lo e a insistir: Paga-me o que me deves.

         ENCONTROU UM - Não se diz se o encontrou por acaso, ou se saiu a procurá-lo; mas isto não importa para a lição da parábola[15]

         CEM DENÁRIOS - Menos de trinta gramas de ouro[16].

         Em si a dívida era de certa importância, pois o denário representa o salário de todo um dia para o trabalhador comum. No entanto, em comparação com a primeira dívida, esta era insignificante[17]

        

         29O companheiro, caindo a seus pés, rogava-lhe. Dá-me um prazo e eu te pagarei.

         30 - Mas ele não quis ouvi-lo; antes, retirou-se e mandou lançá-lo na prisão até que pagasse o que devia.

         NÃO QUIS - Este credor cruel era implacável em sua demanda de que se pagasse o que lhe devia. É difícil conceber tal defeituosa compaixão. Seu egoísmo lhe impedia ver a magnitude de sua própria dívida e apreciar a grandeza da misericórdia que lhe brindava, levou-o a ser desumano com seu conservo[18]

         PRISÃO - Neste caso, o senhor ordenou que fosse vendido com sua família e todas suas posses. Segundo as disposições da lei mosaica, um hebreu podia vender-se a si mesmo ou ser vendido por um credor, mas era vendido só por um tempo limitado. Êxodo 21:2; Levítico 25:15; Deuteronômio 15:12. As disposições legais protegiam essa pessoa do trato duro que costumava ser dado a um escravo. À parte da parábola que fala de que o servo tinha de ser vendido como escravo não deve interpretar-se no sentido de que Deus vende a alguém como escravo[19].

 

         31 - Vendo os seus companheiros de servidão o que acontecera, ficaram muito penalizados e, procurando o senhor, contaram-lhe todo o acontecido.

         PENALIZADOS - Os conservos costumavam proteger-se mutuamente, ocultando ao rei os pequenos furtos feitos a expensas de seu senhor, mas nesta ocasião não puderam reprimir-se de delatar seu conservo ao observar um proceder tão desconsiderado[20]

        

         34 - Assim encolerizado, o senhor o entregou aos verdugos, até que pagasse toda a dívida.

         ENCOLERIZADO - Notar o contraste com a compaixão que o rei tinha manifestado quando a dívida era com ele mesmo. O rei podia tolerar com paciência essa perda, porque para ele era um pouco de pouca importância. Mas a injustiça feita a um de seus súbditos provocou nele uma justa indignação[21]

         VERDUGOS - A palavra grega empregada aqui é a que se usa habitualmente para designar aos carcereiros ou aos verdugos. Seu sentido literal é o que atormenta[22]

          

         35 - Eis como meu Pai celeste agirá convosco, se cada um de vós não perdoar, de coração, ao seu irmão.

         AGIRÁ CONVOSCO - O que se nega a perdoar a outros, elimina a esperança de ser perdoado. Esta é a grande lição da parábola: o abismal contraste entre a crueldade e a falta de misericórdia do homem para com seus próximos e a longanimidade e a misericórdia de Deus para conosco. Antes que acusemos a outros ou exijamos deles o que nos corresponde, faríamos bem em considerar primeiro o modo em que Deus nos tratou em circunstâncias similares e como quereríamos que outros nos tratassem se a situação se invertesse. Mateus 6:12 14 e 15. Em vista da infinita misericórdia de Deus para conosco, deveríamos também manifestar misericórdia para com outros[23]

         DE CORAÇÃO - A falha que tinha na pergunta de Pedro, Mateus 5:21 e 22 era que o perdão ao qual fazia referência não provia do coração, mas um perdão legal, rotineiro, baseado no conceito de conseguir a justificativa mediante obras. Como foi difícil Pedro captar o novo conceito de uma obediência cordial, impelido pelo amor a Deus e a seu próximo! Assim conclui a resposta de Jesus à pergunta de Pedro, resposta que também abarca indiretamente a pergunta a respeito de quem seria o maior no reino dos céus. O maior é, singelamente, aquele que de todo coração reflete na misericórdia de seu Pai celestial e pensa no trato com seu próximo. Esta é a verdadeira medida do caráter em nosso trato com nosso próximo. 

         Tal como o declarou Jesus de forma enfática no Sermão da Montanha, o que determina a natureza de qualquer ação é o que a motiva. Por isso, ainda as ações que parecem ser boas, se são realizadas com o propósito de comprar-se a estima dos homens, não têm valor à vista do céu. Mateus 6:1 a 7. As palavras de perdão, conquanto seja importantes, não são decisivas à vista de Deus. É importante a atitude do coração que dá às palavras essa plenitude de significado que de outro modo não teriam. A pretensão de perdoar, motivada pelas circunstâncias ou por propósitos interiores, pode enganar àquele a quem é concedido o perdão, mas não engana ao que conhece o coração. 1 Samuel 16:7. O perdão sincero é um aspecto importante da perfeição cristã Mateus 5:48[24].

 

Sede misericordiosos como misericordioso é vosso Pai

Não procures distinguir o homem digno do que não é. Que a teus olhos todos os homens sejam iguais para os amares e os servires da mesma forma. Poderás assim levá-los todos ao bem. Não partilhou o Senhor a mesa dos publicanos e das mulheres de má vida, sem afastar de Si os indignos? Do mesmo modo, concederás tu benefícios iguais e honras iguais ao infiel, ao assassino, tanto mais que também ele é teu irmão, pois participa da única natureza humana. Aqui está, meu filho, um mandamento que te dou: que a misericórdia pese sempre mais na tua balança, até ao momento em que sentires em ti a misericórdia que Deus tem para com o Mundo.

Quando percebe o homem que atingiu a pureza do coração? Quando considerar que todos os homens são bons, e nem um lhe apareça impuro e maculado. Então, em verdade ele é puro de coração. Mateus 5:8.

O que é esta pureza? Em poucas palavras, é a misericórdia do coração para com o universo inteiro. E o que é a misericórdia do coração? É a chama que o inflama por toda a criação, pelos homens, pelos pássaros, pelos animais, pelos demônios, por todo o ser criado. Quando o homem pensa neles, quando os olha, sente os olhos encherem-se das lágrimas de uma profunda, de uma intensa piedade que lhe aperta o coração, e que o torna incapaz de ouvir, de ver, de tolerar o erro ou a aflição, mesmo ínfimos, sofridos pelas criaturas. É por isso que na oração acompanhada por lágrimas devemos sempre pedir tanto pelos seres desprovidos de fala como pelos inimigos da verdade, como ainda pelos que a maltratam, para que sejam salvos e purificados. No coração do homem nasce uma compaixão imensa e sem limites, à imagem de Deus[25].

 

PERDÃO HUMANO E DIVINO

Perdoa nossas dívidas como também nós perdoamos aos nossos devedores. Pois se perdoardes aos homens os seus delitos, também vosso Pai celeste vos perdoará os vossos delitos. Mateus 6:12, 14 e 15.

Antes que alguém possa fazer honradamente este pedido da Oração do Senhor, deve se dar conta de que necessita fazê-la. Quer dizer: antes que uma pessoa possa fazer este pedido deve ter o sentimento de pecado. O pecado não é uma palavra popular hoje em dia. Aos homens e as mulheres não lhes é agradável serem chamados de pecadores, e que lhes tratem como peca­dores que merecem o inferno.

O mal é que quase todo mundo tem uma ideia equivo­cada sobre o pecado. Estão de acordo em que um ladrão, um bêbado, um assassino, um adúltero, um blasfemo, são pecadores; porém eles não são culpados de nenhum destes pecados; vivem uma vida decente, normal, corriqueira, respeitável e nunca tem estado em perigo de que os levassem a juízo, ou à prisão. Portanto creem que o pecado não tem nada a ver com eles.

O NT usa cinco palavras diferentes para o pecado.

1. A palavra mais frequente é hamartía. Esta era em sua origem uma palavra relacionada com o tiro, e quer dizer não acertar o alvo. Hamartía era falhar o tiro. Portanto, pecado é falhar em ser o que nos havia sido possível e teríamos capacidade para chegar a ser.

Charles Lamb nos apresenta um personagem chamado Samuel de Grice. Grice era um jovem brilhante que nunca chegou a ser o que prometia. Lamb disse que houve três etapas em sua vida. Houve um tempo quando as pessoas diziam: Ele fará algo. Houve um tempo em que as pessoas diziam: Poderia fazer algo se quisesse. Houve um tempo e que as pessoas diziam: Poderia ter feito algo, se tivesse vontade. Edwin Muir disse em sua Autobiogra­fia: Ao chegar a certa idade, todos nos, bons e maus, estamos sob influência de pensamentos que havia em nós que nunca se tinham tornado realidade de fato; porque, em outras palavras, não somos o que deveras pensamos.

Isto é exatamente hamartía; é precisamente a situação em que todos nos encontramos. Somos tão bons maridos e esposas como poderíamos ser? Somos tão bons filhos ou filhas como poderíamos ser? Somos tão bons traba­lhadores ou empresários como poderíamos ser? há alguém que pretenda ser tudo o que houvesse podido ser, ou haver feito tudo o que houvesse podido fazer? Quando nos damos conta que o pecado quer dizer errar o alvo, fracassar na empresa de ser tudo o que nos havia sido possível e teríamos capacidade para chegar a ser, então está claro que cada um de nos é um pecador.

2. A segunda palavra para pecado é: parábasis, que quer dizer literalmente traspassar. O pecado passa do raio que separa o bem e o mal.

Estamos sempre do lado devido da linha que divide a honestidade da desonestidade? Não tem havido nunca em nossas vidas nenhum detalhe desonesto?

Estamos sempre do lado direito da linha que divide a verdade da falsidade? Em que não temos tergiversado, eva­dido ou nunca distorcendo a verdade, com nossa palavra, atitude, silêncio ou inibição?

Estamos sempre do lado direito da linha que divide a amabilidade e a cortesia do egoísmo e da aspereza? Nunca em nossas vidas praticamos alguma ação ou palavra sem amor?

Quando pensamos nestes termos, não há ninguém que possa pretender haver se mantido sempre do lado correto da linha divisória.

3. A terceira palavra para pecado é: paraptôma, que quer dizer deslizar se para o outro lado. É o que se passa em um solo escorregadio e gelado. Não é tão deliberado como parábasis, mas sem dúvida é algo que todos temos experimen­tado. Uma ou outra vez dizemos que nos tem escapado uma frase, ou um gesto; uma e outra vez tem algo que nos faz perder o equilíbrio, um impulso ou uma paixão que se tem apoderado de nos momentaneamente fazendo com que nos percamos o controle. Os melhores de nós podem deslizar. Pecamos quando a situação nos surpreende com a guarda baixa.

4. A quarta palavra para pecado é: anomia, que quer dizer ilegalidade. Anomia é o pecado da pessoa que sabe o que deve fazer, e sem dúvida não faz ou faz o contrário; é o pecado da pessoa que conhece a lei, mas transgride. O primeiro de todos os instintos humanos é de fazer o que gosta; e portanto chegam a vida de qualquer pessoa momentos quando queria saltar as normas e desa­fiar as leis e fazer com o tema do proibido.

Ainda que alguns possam dizer que nunca quebran­taram os Dez Mandamentos, não há ninguém que possa dizer que não tenha vontade de quebrantar algum deles.

5. A quinta palavra para pecado é: ofeilêma, que é a que se usa no centro da Oração do Senhor; e que quer dizer: dívida. Quer dizer faltar pagar o que se deve, deixar de fazer o que é devido. Não pode haver nenhuma pessoa que se atreva a pretender haver cumprido plenamente seu dever para com Deus e para com seus semelhantes: Não existe tal perfeição na humanidade.

Quando chegamos a ver o que é realmente o pecado, nos damos conta de que é uma enfermidade universal que pade­cem todas as pessoas. A respeitabilidade externa é a vista dos demais, e a pecaminosidade interna a vista de Deus. É o pedido da Oração do Senhor que todo ser humano necessita fazer.

Não só se tem que dar conta de que necessita fazer este pedido; necessita dar conta do que está fazendo e quando faz. De todos os pedidos da Oração do Senhor, este é o mais aterrador.

Perdoa nossas dívidas como nós perdoa­mos a nossos devedores. O sentido literal é: Perdoa nossos pecados na mesma proporção em que nós perdoamos aos que têm pecado contra nós. Nos versos 14 e 15, Jesus diz da maneira mais clara possível que se perdoamos aos outros, Deus nos perdoará; porém se nos negamos a perdoar aos outros, Deus se negará a nos perdoar. Está totalmente claro que, se fazemos este pedido com uma ferida aberta com uma desavença sem acero em nossa vida, estamos pedindo a Deus que não nos perdoe.

Se dizemos: Jamais perdoarei Fulano pelo que me fez; e passamos a tomar este pedido em nossos lábios, estamos deliberadamente pedindo a Deus que não nos perdoe. O perdão, como a paz, é algo indivisível. O perdão humano e o divino não podem estar separados, são intercomunicáveis. Nosso perdão aos semelhantes e o perdão de Deus a nós não podem ser separados; estão vinculados. Se pen­sarmos no que estamos dizendo quando fazemos este pedido, haveria ocasiões que não nos atreveríamos a fazê-lo.

Quando Robert Louis Stevenson vivia nas Ilhas do Mar do Sul, ao fazer o culto familiar pelas manhãs sempre terminava com a Oração do Senhor. Uma manhã, no meio da Oração, ele se colocou em pé; havia estado de joelhos, e saiu de sua casa. Sua saúde era sempre muito precária, e sua mulher saiu atrás dele pensando que poderia sen­tir-se mal. Você está bem? Ela lhe perguntou. Só uma coisa, disse Stevenson: Que não estou em condições de fazer a Oração do Senhor hoje. Não é possível estar em condições de fazer esta Oração quando seu coração está dominado por um espírito de ressentimento. Se não está em paz com seus semelhantes, tampouco pode estar em paz com Deus.

Para haver esse perdão cristão em nossa vida, são necessárias três coisas.

1. Devemos aprender a compreender. Sempre há uma razão para que alguém faça algo. Se está antipático ou descortês ou de mau gênio, preocupado ou angustiado;se nos trata com rudeza ou desagrado, possivelmente haja entendido mal ou se lhe tenha informado mal acerca de algo que tenhamos dito ou feito. Que seja vítima de seu entorno ou de sua herança. Que tenha tal temperamento e a vida lhe resulte difícil,ou as relações humanas são um problema. O perdão nos seria muito mais fácil se fizéssemos um esforço por compreender, antes de permitirmos condenar.

2. Devemos aprender a esquecer. Mesmo que sigamos com desprezo e ofensa, não há esperança de que não cheguemos a perdoar. Dizemos: Não posso esquecer o que me fez Fulano; ou: Não me esquecerei nunca como me tratou, ou se me tratou em tal lugar. São ditos perigosos, porque podemos chegar a fazer que nos seja huma­namente impossível o perdão. Podemos imprimir indelevelmente em nossa memória.

Uma vez, o famoso homem de letras escocês Andrew Lang escreveu e publicou algo muito amável acerca de um livro de um autor de novela, que o atacou com insultos e calúnias. Após três anos, Andrew Lang estava conversando com o poeta laureado Robert Bridges. Robert viu que Andrew lia certo livro, e lhe disse: Este é outro livro que aquele cachorro mal agradecido que se portou tão vergonhosamente contigo. Mas, para sua surpresa, descobriu que Andrew Lang nem sequer sonhava sobre o assunto. Se havia esquecido completa­mente daquele ataque insultante e calunioso. Ao perdoar, disse Bridges, era o sinal da grandeza do homem; mas esquecer era sublime. Só o espírito purificador de Cristo pode quitar dentre nossas recordações as velhas amarguras que devemos esquecer.

3. Devemos aprender a amar. O amor cristão, agapê, é esta benevolência inconquistável, esta boa vontade invencível que não buscará nunca nada mais que o bem supremo da pessoa amada, sem ter em conta como nos trata nem o que nos faz. Este amor pode vir a nos somente quando Cristo, Que é este amor, vem morar em nosso coração e não virá sem que o convidemos.

Para ser perdoados temos que perdoar, e esta é uma condição que só o poder de Cristo nos pode ajudar cumprir[26].

 

O Pecado é Abrangente

         E perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nos­sos devedores. Mateus 6:12.

Antes de fazer essa oração deveríamos reconhecer a necessidade de fazê-la. É preciso admitir com franqueza que somos pecadores. Perdoa-nos as nossas dívidas.

Muitos membros da igreja falham nesse ponto. Pensam no pecado em termos de ser um bêbado, um assassino, etc. O pecado é mais amplo do que isto. As cinco primeiras palavras para pecado no NT mostram que ele infecta e afeta todos os aspectos de nossa vida.

A primeira palavra é harmartia, significa literalmente errar o alvo. O pecado como harmartia é deixar de ser o que poderíamos ter sido. William Barclay ilustra esse ponto com três estágios na nossa vida. Primeiro, vem o tempo em que as pessoas dizem: Ele fará alguma coisa. Depois elas podem dizer: Ele poderia fazer alguma coisa, se quisesse. E finalmente as pessoas dizem: Ele poderia ter feito alguma coisa.

O pecado como harmartia é abrangente. É não ser tudo quanto poderíamos ter sido. E quem poderia ter sido um melhor esposo, esposa, empregado, filho, filha, e assim por diante?

A segunda palavra para pecado é parabasis, que traz consigo a ideia de ultrapassar a linha que separa o certo do errado. O pecado como parabasis abrange vários aspectos em nossa vida. Será que nunca ultrapassamos a linha numa atitude indelicada ou numa palavra ou pensamento descortês?

A terceira palavra para pecado é paptoma, que quer dizer escorregar, igual ao que acontece quando uma pessoa escorrega numa estrada coberta de gelo. Essa espécie de pecado pode ser ilustrada pelo escorregar no temperamento ou nas paixões.

A quarta palavra para pecado é anomia, ou ilegalidade. Esse é pecado da pessoa que sabe o certo, mas faz o errado. Isto é o que a maioria de nós considera pecado.

A última palavra para pecado é opheilema, que é a palavra usada em Mateus 6:12. Opheilema significa débito, deixar de pagar o que se deve. E ninguém pode alegar que pagou todas as suas dívidas para com Deus.

O pecado é mais abrangente do que imaginamos. Todo precisou orar diariamente baseados nos conceitos da oração do Senhor[27].

 

Devedores Audaciosos

E é assim também que Davi declara ser bem-aventurado o homem a quem Deus atribui justiça, independentemente de obras: Bem-aventurados aqueles cujas iniquidades são perdoadas, e cujos pecados são cobertos, bem-aventurado o homem a quem o Senhor jamais imputará pecado. Romanos 4 6 a 8.

Segundo o pensamento rabínico, todo pecado criava uma dívida para com Deus, ao passo que toda obra de justiça contribuía para o acúmulo de créditos do crente perante Deus. Enquanto o acúmulo de boas obras formava uma espécie de ponte para Deus, o acúmulo de dí­vidas morais separava as pessoas Dele.

O conceito de dívida moral era, portanto, bastante familiar para os judeus. Jesus emprega o bem conhecido conceito de dívida moral e as ideias a ele relacionadas para nos dizer que devemos ir ao Pai e pedir-­Lhe que anule nossas dívidas.

Pense nisso! A ideia em si é bastante insolente . É uma atitude au­daciosa para um devedor aproximar-se de um credor e pedir que lhe perdoe um débito. Contudo, Jesus nos ensina a nos aproximarmos de Deus dessa maneira insolente.

O NT também ensina, por meio de seus diversos au­tores, que Deus está mais do que disposto a cancelar nossa dívida, porque nos ama e porque aceitamos Seu amor no sacrifício de Jesus. Deus é um cancelador de dívidas para os que buscam o Seu perdão. Esse é um milagre da graça. Deus não nos dá o que merecemos. Ele nos dá o que precisamos.

É interessante notar, nesse ponto, que a versão de Lucas da Ora­ção do Senhor emprega a palavra pecado, Lucas 11:4, em vez de dí­vida, conforme encontramos em Mateus. Os pecados, obviamente, re­presentam atos de comissão, enquanto as dívidas incluem os atos de omissão. O perdão de Deus abrange, portanto, todos os nossos pecados. Tanto as coisas que fazemos conscientemente contra Deus e contra o nosso próximo, como as coisas que deveríamos ter feito por eles, acham-se incluídas nas duas versões da Oração do Senhor.

Em resumo, todos os nossos pecados podem ser levados ao pé da cruz. Agradecemos-Te, ó Senhor, por sermos capazes de ir confiante­mente a Ti e por sempre atenderes aos sinceros pedidos de perdão[28].

 

Adeus à Graça Barata

Perdoa-nos os nossos pecados, pois também nós perdoamos a todo o que nos deve. Lucas 11:4.

Talvez a palavra mais importante na versão de Mateus, da Ora­ção do Senhor, seja a palavra como. Pedimos a Deus que nos perdoe assim como perdoamos aos outros. Lucas emprega a palavra pois, embora a ideia subjacente seja a mesma. O perdão divino e o humano estão relacionados. Devemos perdoar, assim como somos perdoados. Ora, isso não é fácil para a maioria de nós. A maior parte de nós gosta de receber perdão, mas não vamos além do nosso caminho a fim de buscar oportunidades para concedê-lo.

Jesus aqui está falando aos cristãos. E os cristãos são pessoas que experimentaram a grandeza das misericórdias de Deus. Na verdade, os cristãos são tão agradecidos que desejam transmitir a outros essas mi­sericórdias.

Uma atitude como essa não surge naturalmente. Nascemos com o desejo de retaliar e pagar na mesma moeda o que fazem conosco. Nas­cemos com um coração que não perdoa facilmente.

Isso nos leva a um importante pormenor em Mateus 6:12. Os cris­tãos são pessoas transformadas. Eles não somente tomam parte no ban­quete da graça de Deus; também se tornam dispensadores dessa graça. Os cristãos são pessoas que chegaram a compreender que não podem amar a Deus sem amar os filhos dEle.

A graça barata denota que as pessoas recebem de Deus o perdão, mas depois voltam a viver a mesma vidinha de antes. Jesus, porém, põe um fim na graça barata. A graça de Deus por intermédio de Jesus não apenas perdoa nossas dívidas, mas também muda nossa vida pelo novo nascimento. Jesus não diz: Aceite Meu perdão e continue a vi­ver como antes. Não. Ele diz: Agora que você foi perdoado, vai agir como Eu. Vai cumprir as bem-aventuranças para ser misericordioso. Mateus 5:7. Vai procurar ser perfeito como é perfeito o Pai que está no Céu, porque você amará, e vai perdoar, até mesmo seus inimigos versos 43 a 48.

A salvação é um tecido sem costura. Você não pode ser perdoado ou justificado, sem ao mesmo tempo ser santificado e transformado. Os cristãos perdoarão como Deus perdoa; perdoarão da mesma maneira[29].

 

Chaves Para Perdoar

Qual destes três você acha que foi o próximo do homem que caiu nas mãos dos assaltantes? Aquele que teve misericórdia dele; respondeu o perito na lei. Jesus lhe disse: Vá e faça da mesma forma. Lucas 10:36 e 37.

Jamais perdoarei aquela mulher pelo que ela me fez. Jamais es­quecerei aquela atitude cruel do meu pastor.

Você já abrigou algum dia esses pensamentos? Já nutriu esses for­tes sentimentos para com outra pessoa que verdadeiramente foi injus­ta com você ou com alguém que lhe é caro?

A maioria de nós sim. A maioria de nós luta para perdoar e esque­cer. A maioria de nós se esforça para compreender o fato de que deve­mos ser como Jesus, que podia orar: Perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem, enquanto eles O pregavam na cruz.

Contudo, Deus diz que devemos ser como Ele. Devemos ter espí­rito perdoador assim como Deus.

Mas como, podemos perguntar? Isso nos leva às chaves do perdão. há certas coisas que nos ajudarão a aprender a perdoar.

A primeira é a compreensão. Existem razões muito boas por que as pessoas fazem as coisas. Quando dedicamos tempo para descobrir as ra­zões delas, muitas vezes fica mais fácil perdoá-las.

A segunda é o esquecimento. Precisamos aprender a esquecer. Muita gente continua nutrindo sentimentos de ira e ressentimento. A maioria de nós precisa do poder purificador de Jesus para afastar essas coisas da nossa lembrança. Temos uma escolha. Podemos permanecer no negativo, ou podemos deixar que Ele nos encha de pensamentos novos e limpos.

A terceira é o amor. Temos visto repetidas vezes em nosso estudo do Sermão do Monte que o amor agape de Deus é essa boa vontade para com os outros, que quer apenas o melhor para eles, não importa como nos tratem.

A quarta é a visão da cruz. Os verdadeiros perdoadores precisam de uma imagem diária da cruz. Precisamos reconhecer que Jesus morreu em nosso lugar. Em consequência disso, reconhecemos a necessidade de ser misericordiosos e perdoadores, assim como nosso Salvador[30].

 

7. PERDOA-NOS AS NOSSAS DÍVIDAS ASSIM COMO NÓS TEMOS PERDOADO AOS NOSSOS DEVEDORES

Nesta oração Jesus menciona seis petições. Três delas se referem a Deus, e três a nós. Todas as seis são sumamente importantes, mas Ele parece dar um enfoque especial a uma delas. Ele não conferiu destaque nem a Santificado seja o teu nome, nem a Venha o teu reino, nem a Faça-se a tua vontade assim na terra como nos Céus, embora todos estes fatos sejam de grande importância.

Tampouco Ele enfatiza nossa necessidade de pão, embora seja verdade que sem o alimento todos perecemos. Mas, depois de apresentar toda a oração, o Senhor resolve destacar uma das petições, e faz um comentário especial a respeito dela. Trata-se da seguinte: Perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores. O comentário que ele faz é: Se, porém, não perdoardes aos homens [as suas ofensas], tão pouco vosso Pai vos perdoará as vossas ofensas. Mateus 6:15. 

Não é que Deus somente conceda o perdão na base da permuta. O perdão que damos a outrem não é uma condição para que o perdão divino seja concedido a nós. Antes Ele condiciona nossa própria recepção do perdão de Deus.

Shakespeare disse: A misericórdia não pode ser forçada; ela desce suavemente como a chuva fina que cai do céu. Entretanto, é possível, por exemplo, colocar-se sobre uma planta uma cobertura de ferro, e assim impedir que a água da chuva chegue até ela. Do mesmo modo, podemos rodear nosso coração com uma cerca de rancor e assim estaremos impedindo a entrada da misericórdia de Deus.

Uma atitude errada para com outra pessoa pode prejudicá-la ou não, mas é certo que prejudica a nós.

O educador americano Booker T. Washington definiu a questão muito bem quando disse: Nunca permitirei que minha alma seja aviltada pelo ódio.

Num Programa da TV norte-americana chamado Amós e Andy, havia um homem alto que sempre que encontrava Andy dava-lhe um tapa no peito. Por fim, este ficou cansado daquilo e preparou-lhe uma represália. Agora estou preparado, disse ele a Amós. Coloquei uma carga de dinamite no bolsinho interno do paletó, e quando ele me der o tapa, sua mão vai explodir. Ele se esquecera de que o seu coração também explodiria. A dinamite do ódio pode realmente infligir sofrimentos a outrem, mas também destruirá nosso coração.

As palavras perdão e perdoado são inseparáveis. Estão sempre juntas. Quando a Rainha Caroline da Inglaterra morreu, Lord Chesterfield disse uma frase muito triste: Uma mulher que não perdoava, agora morre sem ser perdoada.

Na cruz, Jesus pronunciou as palavras: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem. Geralmente, quando alguém pratica um ato condenável, sem maldade consciente, nós apenas deploramos o fato. Existe, porém, um motivo mais forte para não guardarmos rancor contra ninguém: porque nós não sabemos. Se compreendêssemos as razões que levam cada pessoa a agir como age, nosso julgamento não seria tão rigoroso.

Tendo nós um conhecimento tão limitado uns dos outros, é um pouco temerário nos colocarmos na posição de juízes. A Bíblia diz: A Mim pertence à vingança; Eu retribuirei, diz o Senhor. Romanos 12:19. É mais sábio deixar o assunto por conta de Deus.

Li em algum lugar o seguinte poema:

Será que Deus abandonou os céus, deixando a teus cuidados julgar entre o que é certo e errado, e o que é que cada um deve fazer?

Creio que ele ainda lá está. E sabe a hora certa de aplicar a vara. Quando julgares a outros. Lembra-te: tu não és Deus. Ele disse que devemos orar assim: Como nós temos perdoado aos nossos devedores.

Certo casal foi a um orfanato para tentar adotar uma criança. Havia ali um garotinho que os atraiu muito. Conversaram com ele e lhe falaram das coisas que poderiam dar-lhe. O que é que você deseja? Ao que ele respondeu: Só quero que alguém me ame.

Isto é o que todo ser humano deseja. No fundo do coração de cada um de nós existe uma grande fome de amor. O problema da solidão é bem mais sério do que pensamos. Entretanto, a maioria das pessoas não é muito fácil de amar. Em geral, elas têm tantos defeitos; dizem o que não devem e muitas possuem espírito antagônico, quase repulsivo. Contudo, Jesus disse: Perdoa-nos... Como nós temos perdoado aos nossos devedores. Esta foi à única petição que ele enfatizou e talvez seja esta a mais difícil de fazer.

Se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas; débitos, pecados! Qualquer uma destas palavras exprimirá bem o que o Senhor tinha em mente. O vocábulo débito sugere a ideia de um não cumprimento de certas obrigações, que não são apenas financeiras. há débitos que resultam de implicações de amizade, de nossa cidadania, etc.

Ofender significa ferir a outrem de algum modo. Nossos conhecidos nos ofendem abusando de nosso tempo e de nosso nome ao falarem mal de nós, etc. Podemos ser ofendidos de diversos modos.

A palavra pecado fala de vício e conduta errônea, e vemos muito disso em nossos amigos. Quanto mais observamos os erros de nossos conhecidos, mais difícil se nos torna dizer esta petição: Como nós temos perdoado aos nossos devedores. Muitas vezes dedicamos afeição a certas pessoas, e depois somos tristemente decepcionados por ela.

Às vezes, nos sentimos como Sir Walter Raleigh, que antes de sua morte escreveu à esposa: Não sei a que amigo encaminhar-te, pois os meus me abandonaram no momento da provação.

Algumas pessoas já foram tão magoadas, que são incapazes de pensar como o poeta Tennysson que disse:

Eu sei que é verdade, haja o que houver, E sinto isto, mesmo em meio ao sofrimento; É melhor amar e sofrer, Do que nunca amar.

Devemos notar, porém, que Jesus disse: Perdoa-nos as nossas dívidas. Ele chama atenção, em primeiro lugar, para nossas próprias dívidas, ofensas e pecados. As faltas dos outros também são encontradas em nós. Talvez não sejam exatamente as mesmas e podem ser até piores. Ele não disse: Perdoa-nos se nós pecarmos. Não existe nenhum se.

Façamos a nós mesmos, com toda a sinceridade, as seguintes perguntas: Qual é meu erro mais grave? Isto é, onde é que tenho falhado em meu dever? Que pessoas tenho ofendido? Quais os pecados que tenho cometido? Cada um de nós terá suas próprias respostas para estas perguntas. Todos nós erramos.

Entretanto, nossos amigos e conhecidos também terão respostas a estas perguntas. Também eles erram. O importante é sabermos que, se estivermos dispostos a perdoá-los, então poderemos receber o perdão de Deus. Quanto a mim, isto me parece mais que justo. O que pensa você?[31]

 

Como Aumentar a Fé e a Confiança

Cristo recebia constantemente do Pai, para que nos pudesse comunicar. A palavra que ouvistes, disse Ele, não é Minha, mas do Pai que Me enviou. João 14:24. O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir. Mateus 20:28. Vivia, meditava e orava não para Si mesmo, mas para os outros. Depois de passar horas com Deus, apresentava-Se manhã após manhã para comunicar aos homens a luz do Céu. Cotidianamente recebia novo batismo do Espírito Santo. Nas primeiras horas do novo dia o Senhor O despertava de Seu repouso, e Sua alma e lábios eram ungidos de graça para que a pudesse transmitir a outros. As palavras Lhe eram dadas diretamente das cortes celestes, palavras que pudesse falar oportunamente aos cansados e oprimidos. O Senhor Iahweh, disse, Me deu uma língua erudita, para que Eu saiba dizer, a seu tempo, uma boa palavra ao que está cansado: Ele desperta-Me todas as manhãs, Me desperta o ouvido para que ouça como aqueles que aprendem. Isaías:4 

As orações de Cristo e Seu habito de comunhão com Deus impressionavam muito os discípulos. Um dia, depois de breve ausência de Seu Senhor, encontraram-nO absorto em súplicas. Parecendo inconsciente da presença deles, continuou orando em alta voz. O coração dos discípulos foi movido profundamente. Ao cessar Ele de orar, exclamaram: Senhor ensina-nos a orar. Lucas 11:1.

Correspondendo ao pedido, Cristo proferiu a oração do Senhor, tal como a dera no sermão da montanha. Ilustrou, então, por meio de uma parábola, a lição que desejava dar-lhes. 

Qual de vós, disse, terá um amigo e, se for procurá-lo à meia-noite, lhe disser: Amigo, empresta-me três pães, pois que um amigo meu chegou à minha casa, vindo de caminho, e não tenho o que apresentar-lhe; se ele, respondendo de dentro, disser: Não me importunes; já está à porta fechada, e os meus filhos estão comigo na cama; não posso levantar-me para tos dar. Digo-vos que, ainda que se não levante a dar-lhos por ser seu amigo, levantar-se-á, todavia, por causa da sua importunação e lhe dará tudo o que houver mister. Lucas 11:5 a 8

Cristo representa aqui o suplicante solicitando, para que pudesse dar. Precisa obter pão, senão não pode suprir as necessidades de um viajante cansado e retardatário. Embora o vizinho não queira ser importunado, não desanimará seu pedido; o amigo precisa ser auxiliado; e finalmente a sua importunação é recompensada; seus desejos são satisfeitos. 

Do mesmo modo os discípulos deveriam solicitar bênçãos de Deus. No alimentar a multidão e no sermão sobre o pão do Céu, Cristo lhes descobrira sua obra como representantes Seus. Deviam dar ao povo o pão da vida. Ele que lhes designara a obra, viu quantas vezes sua fé seria provada. Frequentemente se lhes deparariam situações imprevistas e reconheceriam sua insuficiência humana. Pessoas famintas do pão da vida iriam ter com eles, e eles se sentiriam destituídos de recursos. Precisavam receber alimento espiritual, pois de outro modo nada teriam para repartir. Não deviam, porém, despedir pessoa alguma sem alimentá-la. Cristo lhes apontou a fonte de provisão. O homem não despediu o amigo que a ele recorreu para hospedar-se, embora chegasse à hora inoportuna da meia-noite. Nada tinha para apresentar-lhe, mas recorreu a alguém que tinha alimento e insistiu em sua petição até o vizinho lhe suprir a necessidade. E não supriria Deus, que enviou Seus servos para alimentar os famintos, o de que precisassem para Sua própria obra? 

Mas o vizinho egoísta da parábola não representa o caráter de Deus. A lição é tirada, não por comparação, mas por contraste. O homem egoísta atenderá a um pedido urgente, para livrar-se de alguém que lhe perturba o repouso. Deus, porém, Se deleita em dar. É cheio de compaixão e anseia por atender às petições dos que a Ele recorrem pela fé. Dá-nos para que sirvamos a outros e deste modo nos assemelhemos a Ele. 

Cristo declara: Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei, e abrir-se-vos-á; porque qualquer que pede recebe; e quem busca acha; e a quem bate abrir-se-lhe-á. Lucas 11:9 e 10

O Salvador continua: Qual o pai dentre vós que, se o filho lhe pedir pão, lhe dará uma pedra? Ou também, se lhe pedir peixe, lhe dará por peixe uma serpente? Ou também, se lhe pedir um ovo, lhe dará um escorpião? Pois, se vós, sendo maus, sabeis dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais dará o Pai celestial o Espírito Santo àqueles que Lho pedirem? Lucas 11:1 a 13

Para fortalecer-nos a confiança em Deus, Cristo nos ensina a dirigirmos-nos a Ele por um nome novo, um nome enlaçado com as mais caras relações do coração humano. Concede-nos o privilégio de chamar o infinito Deus de nosso Pai. Este nome dito a Ele ou Dele, é um sinal de nosso amor e confiança para com Ele, e um penhor de Sua consideração e parentesco conosco. Pronunciado ao pedir Seu favor ou bênçãos, soa-Lhe aos ouvidos como música. Para que não julgássemos presunção invocá-Lo por este nome, repetiu-o muitas vezes. Deseja que nos familiarizemos com este trato. 

Deus nos considera filhos Seus. Redimiu-nos do mundo indiferente, e nos escolheu para tornar-nos membros da família real, filhos e filhas do celeste Rei. Convida-nos a Nele confiar, com confiança mais profunda e mais forte que a do filho no pai terrestre. Os pais amam os filhos, mas o amor de Deus é maior, mais largo e mais profundo do que jamais pode sê-lo o amor humano. É incomensurável. Portanto, se os pais terrestres sabem dar boas dádivas a seus filhos, quanto mais não dará nosso Pai do Céu o Espírito Santo àqueles que Lho pedirem? 

As lições de Cristo referentes à oração devem ser ponderadas cuidadosamente. Há uma ciência divina na oração, e Sua ilustração apresenta-nos princípios que todos necessitam compreender. Mostra qual é o verdadeiro espírito da oração, ensina a necessidade de perseverança ao expormos nossas súplicas a Deus, e nos assegura Sua boa vontade de ouvir as orações e a elas atender. 

Nossas orações não devem ser uma solicitação egoísta, meramente para nosso próprio benefício. Devemos pedir para podermos dar. O princípio da vida de Cristo deve ser o princípio de nossa vida. Por eles Me santifico a Mim mesmo, disse, referindo-Se aos discípulos, para que também eles sejam santificados. João 17:19. A mesma devoção, o mesmo sacrifício, a mesma submissão às reivindicações da Palavra de Deus, manifestos em Cristo, devem ser vistos em Seus servos. Nossa missão no mundo não é servir ou agradar a nós mesmos; devemos glorificar a Deus, com Ele cooperando para salvar pecadores. Devemos suplicar de Deus bênçãos para partilhar com outros. A capacidade de receber só é preservada compartilhando. Não podemos continuar recebendo os tesouros celestiais sem os transmitir aos que estão ao nosso redor. 

Na parábola, o suplicante foi repelido várias vezes; porém não desistiu de sua intenção. Assim, nossas orações nem sempre parece serem atendidas imediatamente; mas Cristo ensina que não devemos cessar de orar. A oração não se destina a efetuar qualquer mudança em Deus, deve elevar-nos à harmonia com Ele. Ao Lhe fazermos alguma petição, pode ver que nos é necessário examinar o coração e arrepender-nos do pecado. Por isso nos faz passar por dificuldades, provações e humilhações, para que vejamos o que impede em nós a operação do Espírito Santo. 

Ha condições para o cumprimento das promessas de Deus, e a oração nunca pode substituir o dever. Se Me amardes, diz Cristo, guardareis os Meus mandamentos. João 14:15. Aquele que tem os Meus mandamentos e os guarda, este é o que Me ama; e aquele que Me ama será amado de Meu Pai, e Eu o amarei e Me manifestarei a ele. João 14:21. Aqueles que apresentam suas petições a Deus, reivindicando Sua promessa, enquanto não satisfazem as condições, ofendem a Iahweh. Apresenta o nome de Cristo como autoridade para o cumprimento da promessa, porém não fazem aquilo que demonstraria fé em Cristo e amor a Ele. 

Muitos infringem a condição sob a qual são aceitos pelo Pai. Devemos examinar minuciosamente o ato de confiança de nos achegarmos a Deus. Se formos desobedientes apresentamos ao Senhor uma nota para ser paga, quando não preenchemos as condições que no-la tornaria pagável. Expomos a Deus Suas promessas e Lhe pedimos cumprir as mesmas, quando se o fizesse desonraria Seu nome.

A promessa é: Se vós estiverdes em Mim, e as Minhas palavras estiverem em vós, pedireis tudo o que quiserdes, e vos será feito. João 15:7. E João declara: Nisto sabemos que O conhecemos: se guardarmos os Seus mandamentos. Aquele que diz: Eu conheço-O e não guarda os Seus mandamentos é mentiroso, e nele não está à verdade. Mas qualquer que guarda a Sua Palavra, o amor de Deus está nele verdadeiramente aperfeiçoado; nisto conhecemos que estamos Nele. I João 2:3 a 5

Um dos últimos mandamentos de Cristo aos discípulos foi: Que vos ameis uns aos outros; como Eu vos amei a vós. João 13:34. Obedecemos a este mandamento, ou cultivamos rudes traços de caráter diferentes dos de Cristo? Se causarmos de qualquer maneira dores e tristezas a outros, é nosso dever confessar nossa falta e procurar reconciliação. Esta é uma preparação essencial para nos podermos achegar pela fé a Deus para Lhe solicitar as bênçãos. 

Ha outro ponto frequentemente negligenciado por aqueles que procuram a Deus em oração. Tendes sido fiéis para com vosso Deus? O Senhor declara pelo profeta Malaquias: Desde os dias de vossos pais, vos desviastes dos Meus estatutos e não os guardastes; tornai vós para Mim, e Eu tornarei para vós, diz o Senhor dos Exércitos; mas vós dizeis: Em que havemos de tornar? Roubará o homem a Deus? Todavia vós Me roubais e dizeis: Em que Te roubamos? Nos dízimos e nas ofertas alçadas. Malaquias 3:7 e 8.

Como Doador de todas as bênçãos, Deus requer certa porção de tudo quanto possuímos. Esta é uma providência para sustentar a pregação do evangelho. Restituindo a Deus essa parte, testemunharemos nosso apreço por Suas dádivas. Como podemos, pois, reivindicar Suas bênçãos, se retemos o que Lhe pertence? Como podemos esperar que nos confie coisas celestiais, se somos mordomos infiéis das terrenas? Pode ser que nisso esteja o segredo das orações não atendidas. 

Em Sua grande misericórdia, o Senhor está pronto a perdoar, e diz: Trazei todos os dízimos à casa do tesouro, para que haja mantimento na Minha casa, e depois fazei prova de Mim... Se Eu não vos abrir as janelas do Céu e não derramar sobre vós uma bênção tal, que dela vos advenha à maior abastança. E, por causa de vós, repreenderei o devorador, para que não vos consuma o fruto da terra; e a vide no campo vos não será estéril... E todas as nações vos chamarão bem-aventurados; porque vós sereis uma terra deleitosa, diz o Senhor dos Exércitos. Malaquias 3:10 a 12

O mesmo se dá com todos os reclamos de Deus. Todas as dádivas são prometidas sob a condição de obediência. Deus tem um Céu cheio de bênçãos para aqueles que com Ele cooperarem. Todos quantos Lhe são obedientes podem com confiança pedir o cumprimento de Suas promessas. 

Devemos mostrar firme e inabalável confiança em Deus. Às vezes, Ele tarda a responder para provar-nos a fé ou experimentar a sinceridade de nosso desejo. Havendo nós pedido em harmonia com Sua Palavra, devemos crer em Sua promessa, e insistir em nossas petições com determinação inabalável. 

Deus não nos diz: Pedi uma vez, e dar-se-vos-á. Requer que peçamos. Persistir incansavelmente em oração. A súplica persistente põe o peticionário em atitude mais fervorosa, e dá-lhe maior desejo de receber o que pede. Junto ao túmulo de Lázaro, Cristo disse a Marta: Não lhe falei que, se você cresse, veria a glória de Deus?João 11:40

Muitos, porém, não possuem fé viva. Esta é a razão de não provarem mais do poder de Deus. Sua fraqueza é consequência da incredulidade. Têm mais fé em seu próprio recurso do que na operação de Deus por eles. Procuram guardar-se a si mesmos. Planejam e arquitetam, mas oram pouco e têm pouca confiança real em Deus. Pensam possuir fé, mas é somente o impulso do momento. Por não reconhecerem sua própria necessidade ou a voluntariedade de Deus em dar, não perseveram em apresentar perante o Senhor suas súplicas. 

Nossas orações devem ser tão fervorosas e persistentes, quanto à petição do amigo necessitado que solicitasse os pães à meia-noite. Quanto mais sincera e perseverantemente pedirmos, tanto mais íntima será nossa união espiritual com Cristo. Receberemos maiores bênçãos, porque possuímos maior fé. 

Nossa parte é orar e crer. Vigiai em oração. Vigiai e cooperai com o Deus que ouve as orações. Lembrai-vos de que somos cooperadores de Deus. 1 Coríntios 3:9. Falai e procedei em harmonia com vossas orações. Fará diferença infinita para vós, se a provação manifestar que vossa fé é genuína, ou que vossas orações são apenas formais. 

Quando surgirem perplexidades, e dificuldades vos confrontarem, não espereis auxílio de homens. Confiai inteiramente em Deus. O costume de contar as dificuldades a outros, só nos torna fracos e não lhes traz força. Sobrecarrega-os com o fardo de nossas fraquezas espirituais, que não podem remediar. Procuramos os recursos de homens errantes e finitos, quando poderíamos ter a força do Deus infalível e infinito. 

Não precisamos ir aos extremos da Terra em busca de sabedoria, porque Deus está perto. Não é a capacidade que agora possuímos ou havemos de possuir, que nos dará êxito. É o que o Senhor pode fazer por nós. Deveríamos depositar muito menos confiança no que o homem é capaz de fazer, e muito mais no que Deus pode fazer para cada alma crente. Anseia Ele que Lhe estendamos as mãos pela fé. Anseia que esperemos grandes coisas Dele. Anela dar-nos sabedoria, tanto nos assuntos temporais como nos espirituais. Pode aguçar o intelecto. Pode dar tato e habilidade. Empreguemos nossos talentos na obra, peçamos a Deus sabedoria, e ser-nos-á dada. 

A Palavra de Cristo como nossa segurança. Não nos convidou a ir a Ele? Nunca nos permitamos falar de modo desesperançado e desanimado. Perderemos muito, se o fizermos. Olhando as aparências e lamentando quando vêm dificuldades e angústias, damos prova de fé doentia e débil. Falemos e procedamos como se a vossa fé fosse invencível. O Senhor é rico em recursos; pertence-Lhe todo o mundo. Pela fé olhemos para o Céu. Contemplemos Aquele que tem luz e poder e eficiência. 

Ha na fé genuína, firmeza e constância de princípio, e estabilidade de propósito, que nem o tempo nem fadigas podem enfraquecer. Os jovens se cansarão e se fatigarão, e os mancebos certamente cairão. Mas os que esperam no Senhor renovarão as suas forças e subirão com asas como águias; correrão e não se cansarão; caminharão e não se fatigarão. Isaías 40:30 e 31

Muitos há que anelam auxiliar a outros, mas sentem que não possuem capacidade ou luz espiritual para partilhar. Apresentem estes as suas petições perante o trono da graça. Rogue pelo Espírito Santo. Deus mantém cada promessa que fez. Com a Bíblia nas mãos, diga: Fiz como disseste. Apresento Tua promessa: Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei, e abrir-se-vos-á. Lucas 11:9

Precisamos não só pedir em nome de Cristo, mas também pela inspiração do Espírito Santo. Isto explica o que significa o dito de que: O mesmo Espírito intercede por nós com gemidos inexprimíveis. Romanos 8:26. Tais orações Deus Se deleita em atender. Quando proferirmos uma oração com fervor e intensidade no nome de Cristo, há nessa mesma intensidade o penhor de Deus de que Ele está prestes a atender à nossa súplica muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos. Efésios 3:20

Cristo disse: Tudo o que pedirdes, orando, crede que o recebereis e tê-lo-eis. Marcos 11:24. Tudo quanto pedirdes em Meu nome, Eu o farei, para que o Pai seja glorificado no Filho. João 14:13. E o amado João, sob inspiração do Espírito Santo, diz com clareza e confiança: Se pedirmos alguma coisa, segundo a Sua vontade, Ele nos ouve. E, se sabemos que nos ouve em tudo o que pedimos, sabemos que alcançamos as petições que Lhe fizemos. I João 5:14 e 15. Portanto insistamos em nossas petições ao Pai em nome de Jesus. Deus honrará esse nome. 

O arco-íris sobre o trono é a garantia de que Deus é verdadeiro e que Nele não há mudança nem sombra de variação. Temos pecado contra Ele e somos indignos de Seu favor; todavia Ele mesmo nos pôs nos lábios a mais maravilhosa de todas as petições: Não nos rejeites por amor do Teu nome; não abatas o trono da Tua glória; lembra-Te e não anules o Teu concerto conosco. Jeremias 14:21. Quando a Ele formos, confessando nossa indignidade e pecado, Ele Se comprometeu a atender-nos ao clamor. A honra de Seu trono foi-nos dada como penhor do cumprimento de Sua Palavra. 

Como Arão, que simbolizava a Cristo, nosso Salvador no santuário celestial traz sobre o coração o nome de Seu povo. Nosso grande Sumo Sacerdote Se lembra de todas as palavras pelas quais nos animou a confiar. Lembra-Se continuamente de Seu concerto. 

Todos os que O buscarem, O acharão. A todos os que batem será aberta a porta. Não será dada a desculpa: Não me importunes; a porta está cerrada; não desejo abri-la. Jamais será dito a alguém: Não vos posso auxiliar. Os que pedem pão à meia-noite para alimentar pessoas famintas, serão atendidos. 

Na parábola, aquele que solicita pão para o estrangeiro, recebe tudo o que houver mister. Lucas 11:8. E em que medida nos dará Deus, para que possamos compartilhar com outros? Segundo a medida do dom de Cristo. Efésios 4:7. Anjos vigiam com intenso interesse para ver como os homens procedem com seu próximo. 

Notam-se que alguém demonstra para com os errantes simpatia semelhante à de Cristo, agrupam-se em torno Dele e lembram-lhe palavras para proferir, que serão para a pessoa como o pão da vida. Assim, Deus, segundo as Suas riquezas, suprirá todas as vossas necessidades em glória, por Cristo Jesus. Filipenses 4:19. Tornará vosso testemunho sincero e real, forte no poder da vida futura. A Palavra do Senhor será em vossa boca verdade e justiça. 

Ao trabalho pessoal por outros, deve preceder muita oração particular, pois requer grande sabedoria o compreender a ciência da salvação de pessoas. Antes de comunicar-vos com os homens, comungai com Cristo. Junto ao trono da graça celestial preparai-vos para ministrar ao povo. 

Quebrante-se o coração pelo anelo que tem de Deus, do Deus vivo. A vida de Cristo mostrou o que a humanidade pode fazer se participar da natureza divina. Tudo quanto Cristo recebeu de Deus, podemos nós possuir também. Portanto, pedi e recebei. Com a perseverante fé de Jacó, com a invencível persistência de Elias reclamai tudo quanto Deus prometeu. 

Que vossa mente seja possuída pelas gloriosas concepções de Deus. Una-se vossa vida, por elos ocultos, à vida de Jesus. Aquele que fez que das trevas resplandecesse a luz, deseja resplandecer em vosso coração para iluminação do conhecimento da gloria de Deus, na face de Jesus Cristo. O Espírito Santo tomará as coisas de Deus e vo-las revelará, transmitindo-as como força viva ao coração obediente. Cristo vos conduzirá ao limiar do Infinito. Podeis contemplar a glória além do véu, e revelar aos homens a suficiência Daquele que vive eternamente para interceder por nós[32]·. 

 

LEITURA ADICIONAL

Perdoa-nos os nossos pecados, pois também nós perdoamos a qualquer que nos deve. Lucas 11:4

Jesus nos ensina que só poderemos receber o perdão de Deus se também nós perdoarmos aos outros. É o amor de Deus que nos atrai para Ele, e esse amor não nos pode tocar o coração sem criar amor por nossos irmãos. 

Terminando a oração do Senhor, Jesus acrescentou: Se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará a vós. Se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai vos não perdoará as vossas ofensas. Mateus 6:14 e 15. Aquele que não perdoa, obstrui o próprio conduto pelo qual, unicamente, pode receber misericórdia de Deus. Não deve pensar que, a menos que os que nos prejudicaram, confessem o mal, estamos justificados ao privá-los de nosso perdão. É dever deles, sem dúvida, humilhar o coração pelo arrependimento e confissão; cumpre-nos, porém, ter espírito de compaixão para com os que pecaram contra nós, quer confessem quer não suas faltas. Não importa quão cruelmente nos tenham ferido, não devemos acariciar nossos ressentimentos, simpatizando com nós mesmos pelos males que nos são causados; mas, como esperamos nos sejam perdoadas nossas ofensas contra Deus, cumpre-nos perdoar a todos os que nos têm feito mal. 

O perdão, porém, tem sentido mais amplo do que muitos supõem. Dando a promessa de que perdoará abundantemente, Deus acrescenta, como se o significado dessa promessa excedesse a tudo que pudéssemos compreender: Os Meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos, os Meus caminhos, diz o Senhor. Porque, assim como os céus são mais altos do que a Terra, assim são os Meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os Meus pensamentos, mais altos do que os vossos pensamentos. Isaías 55:8 e 9. O perdão de Deus não é meramente um ato judicial pelo qual Ele nos livra da condenação. É não somente perdão pelo pecado, mas livramento do pecado. É o transbordamento de amor redentor que transforma o coração. Davi tinha a verdadeira concepção do perdão ao orar: Cria em mim, ó Deus, um coração puro e renova em mim um espírito reto. Salmo 51:10. E noutro lugar ele diz: Quanto está longe o Oriente do Ocidente, assim afasta de nós as nossas transgressões. Salmo 103:12

Deus, em Cristo, ofereceu-Se por nossos pecados. Sofreu a cruel morte de cruz, carregou por nós o peso da culpa, o justo pelos injustos. 1 Pedro 3:18, a fim de poder manifestar-nos Seu amor, e atrair-nos a Si. E diz: Sede uns para com os outros benignos, misericordiosos, perdoando-vos uns aos outros, como também Deus vos perdoou em Cristo. Efésios 4:32. Que Cristo, a divina Vida, habite em vós, e manifeste por vosso intermédio o amor de origem celeste que irá inspirar esperança no desalentado e levar paz ao coração ferido pelo pecado. Ao aproximar-nos de Deus, eis a condição que temos de satisfazer ao pisar o limiar; que, recebendo misericórdia de Sua parte, nos entreguemos a nós mesmos para revelar a outros Sua graça. 

O elemento essencial para que possamos receber e comunicar o amor perdoador de Deus é conhecer e crer o amor que Ele nos tem. 1 João 4:16. Satanás opera por meio de todo engano de que pode dispor a fim de não distinguirmos esse amor. Levar-nos-á a pensar que nossas faltas e transgressões têm sido tão ofensivas que o Senhor não tomará em consideração nossas orações, e não nos abençoará nem salvará. Não podemos ver em nós mesmos senão fraqueza, coisa alguma que nos recomende a Deus, e Satanás nos diz que é inútil; não podemos remediar nossos defeitos de caráter. Quando tentamos ir ter com Deus, o inimigo segreda: Não adianta orares; não praticaste aquela má ação? Não pecaste contra Deus, e não violaste tua consciência? Temos, porém, o direito de dizer ao inimigo que o sangue de Jesus Cristo, Seu Filho, nos purifica de todo pecado. 1 João 1:7. Quando sentimos que pecamos, e não nos é possível orar, é o momento de orar. Talvez nos sintamos envergonhados e profundamente humilhados; devemos, porém, orar e crer. Esta é uma palavra fiel e digna de toda aceitação: que Cristo Jesus veio ao mundo, para salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal. 1 Timóteo 1:15. O perdão, a reconciliação com Deus, não nos é concedido, como recompensa por nossas obras, não é outorgado em virtude dos méritos de homens pecadores, mas é uma dádiva feita a nós, a qual tem na imaculada justiça de Cristo o fundamento de Sua disposição. 

Não devemos procurar diminuir nossa culpa escusando o pecado. Cumpre-nos aceitar a divina avaliação do pecado, e essa é deveras pesada. Unicamente o Calvário pode revelar a terrível enormidade do pecado. Caso devêssemos suportar nossa própria culpa, ela nos esmagaria. Mas o Inocente tomou-nos o lugar; conquanto não a merecesse, Ele assumiu a nossa iniquidade. Se confessarmos os nossos pecados, Deus é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça. 1 João 1:9. Gloriosa verdade! Justo para com Sua lei, e, todavia Justificador de todos quantos acreditam em Jesus. Quem, ó Deus, é semelhante a Ti, que perdoas a iniquidade e que Te esqueces da rebelião do restante da Tua herança? O Senhor não retém a Sua ira para sempre, porque tem prazer na benignidade. Miqueias 7:18[33].



[1] CBASD, vol. 5, pp. 337 e 338.

[2] CBASD, vol. 5, p. 338.

[3] CBASD, vol. 5, p. 338.

[4] CBASD, vol. 5 p. 438.

[5] CBASD, vol. 5 p. 438.

[6] CBASD, vol. 5 p. 438.

[7] BJ, p. 1873.

[8] CBASD, vol. 5, p. 438.

[9] CBASD, vol. 1, pp. 623 e 624.

[10] CBASD, vol, 1, p. 825.

[11] CBASD, vol. 1, pp. 1.019 e 1.020.

[12] CBASD, vol. 5, p. 438.

[13] CBASD, vol. 5, p. 283.

[14] CBASD, vol. 5, p. 438.

[15] CBASD, vol. 5, p. 439.

[16] BJ, p. 1874.

[17] CBASD, vol. 5, p. 439.

[18] CBASD, vol. 5, p. 439.

[19] CBASD, vol. 5, p. 439.

[20] CBASD, vol. 5, p. 439.

[21] CBASD, vol. 5, p. 439.

[22] CBASD, vol. 5, p. 439.

[23] CBASD, vol. 5, p. 439.

[24] CBASD, vol. 5, p. 439.

[25] Santo Isaac, o Sírio (séc. VII), monge em Nínive, perto de Mossul, no actual Iraque, Discursos ascéticos, 1ª série, n.º 81

[26] Comentário ao Novo Testamento, Willian Barclay, Editora Clie Mateus, vol. 1, pp. 251 a 256.

[27] MM, 2001, No Monte das Bem aventuranças, George Rua Knight, p. 222.

[28] MM, 2001, No Monte das Bem aventuranças, George Rua Knight, p. 223.

[29] MM, 2001, No Monte das Bem aventuranças, George Rua Knight, p. 224.

[30] MM, 2001, No Monte das Bem aventuranças, George Rua Knight, p. 225.

[31] A Psiquiatria de Deus, Charles L. Allen, Editora Betânia, pp. 90 a 94.

[32] Parábolas de Jesus, Ellen Gold White, CPB, pp. 139 a 149.

[33] O Maior Discurso de Cristo, Ellen Gold White, CPB, pp. 113 a 116.